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LESÕES EM ALTO RELEVO



Os queloides são espécies de cicatrizes descontroladas, que se expandem e viram grandes marcas no corpo. A ciência ainda não tem explicações completas, mas há várias opções de tratamento para tentar amenizar o problema.

Parte do corpo do administrador de empresas Esrom Golçalves Rodrigues, 33 anos, traz cicatrizes que o constrangem desde o fim da adolescência. Os queloides que ainda tomam a região do peito, das costas e dos ombros são resultado do processo de cicatrização das esp inhas que apareceram naquela fase da vida. Também conhecidas como lesões queloidianas, essas marcas exibem aspecto elevado, com tecido fibroso protuberante, que se expande para além da área da pele atingida por um corte ou um ferimento. Dependendo da predisposição genética do indivíduo e da condição da pele, a disfunção traz transtornos que extrapolam o estético. “Não tinha ideia do que eram essas lesões. A espinha secava e uma marca em alto relevo, pior que ela, aparecia. Imagine isso em vário s pontos do corpo. Passei a juventude procurando tratamento. O problema limita a pessoa socialmente. Evitava situações em que supostamente deveria ficar mais à vontade, tinha vergonha de ir a clubes e à praia”, revela.

O queloide é resultado da proliferação exagerada de fibroblastos(1) e colágeno nos processos cicatriciais.

As lesões apresentam alto relevo, como se um tecido tivesse sido sobreposto ao outro. A ciência ainda não explica a causa, mas pessoas com pele n egra ou morena são mais propensas a esse tipo de cicatriz. Áreas do corpo como os ombros, o dorso, o lóbulo da orelha, a parte baixa da barriga, as costas e o umbigo têm maior vulnerabilidade ao queloide. “Alguns sintomas como dor, sensibilidade exarcebada e coceira são comuns. A lesão queloidiana pode ocorrer na face também, embora seja mais rara. O paciente tem a sensação de que a pele está crescendo excessiva e descontroladamente, porque a cicatriz invade os tecidos vizinhos, adquire forma i rregular, hiperpigmentada e rígida”, explica o dermatologista Erasmo Tokarski.

O queloide é um tumor benigno que tem grande chance de voltar a se manifestar mesmo depois do tratamento. Isso porque a pele de cada um apresenta características individuais e as terapias não funcionam da mesma forma em todos os pacientes. Além disso, para amenizar o aspecto da lesão, geralmente é preciso aliar mais de um tipo de terapia. Injeções de bleomicina, medicamento quimioterápico que minimiza a produção de colágeno na pele, têm ganhado espaço nos consultórios dermatológicos. Crioterapia e remoção cirúrgica também estão entre os aparatos usados por especialistas.

O dermatologista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica Gustavo Tha observa que muitos pacientes imaginam que a laserterapia pode ajudar. “Quando o queloide é largo e espesso, é preciso fazer a remoção cirúrgica e lançar mão de medicamentos que inibem o retorno do tumor. Além da bleomicina e de outros quimiote rápicos, também são indicadas injeções de corticoide, substância que atua na célula produtora do colágeno. O laser tem boa eficácia apenas no clareamento de cicatrizes normais”, pontua o médico.

A betaterapia, tipo de radiação usada para prevenir o problema em indivíduos que sabem que são propensos a ele, também reduz a proliferação anormal de células de colágeno. Depois de procedimentos cirúrgicos que demandam cortes, por exemplo, o paciente passa por algumas sessões para evitar que uma lesão protuberante apareça. “Aparatos pós-operatórios, como malhas de compressão e adesivos de silicone que umidificam a derme são aliados do tratamento”, especifica Tha. No caso de Esrom, várias tentativas terapêuticas foram feitas até que os queloides fossem amenizados. Na primeira vez que ele procurou um especialista, as injeções de corticoides não deram bons resultados. “Tentei também a retirada cirúrgica, mas o problema se agravou. Agora, estou tratando novamente com injeções. Espero q ue dessa vez dê certo. A cicatriz causa estranheza em quem não conhece o problema. Não tem sido fácil conviver com elas, mas é preciso administrar para não acabar se isolando socialmente”, pondera.

A volta do biquíni
A advogada Keila de Freitas Bittencourt, 36 anos, teve o primeiro queloide há duas décadas. Um furúnculo na perna esquerda deu origem à lesão. Os cortes dos partos cesarianos dos dois filhos e uma cirurgia no seio também geraram marcas tão protuberantes que era m percebidas mesmo sob a roupa. “Isso passou a comprometer o meu dia a dia, porque o queloide coçava e estava com uma pigmentação mais escura que a minha pele. Evitava biquíni e até a malha da academia me incomodava, porque a marca tinha a espessura de um dedo”, conta. No caso de Keila, as injeções de bleomicina amenizaram tanto o aspecto das cicatrizes que ela já encara o biquíni sem qualquer constrangimento.

O cirurgião plástico Bernardo Hochman lembra que, por ser o maior e mais sup erficial órgão do corpo humano, a pele está sempre exposta a ferimentos. Qualquer doença que comprometa seriamente essa estrutura repercute de forma negativa na vida da pessoa. Segundo ele, além de coçar muito e doer, os tumores podem crescer e alcançar a dimensão de uma bola de tênis. Novos estudos sugerem que indivíduos com pele oleosa têm mais tendência a desenvolver queloides, assim como os obesos e os estressados.

Hochman explica que o tratamento cirúrgico de primeira linha consi ste na remoção da lesão seguida da betaterapia. No entanto, o índice de retorno aos consultórios devido ao insucesso do tratamento é alto e fica em torno de 80%. Alguns fatores contribuem para a reincidência. “É importantíssimo não deixar nenhum pedacinho do tumor. Caso contrário, ele voltará, com toda certeza. A sutura também não pode ficar tensa”, pondera o médico.

Atualmente, uma técnica pré-cirúrgica que expande os tecidos tem auxiliado cirurgiões e pacientes no tratamento. “O cir urgião implanta um expansor de silicone, que é preenchido com soro fisiológico durante o mês que antecede a cirurgia. Assim, quando o queloide é retirado, a pele está preparada para uma sutura segura. Além disso, podemos adequar a pele, por meio de boa alimentação e de medicamentos que minimizam a ação inflamatória antes dos procedimentos”, detalha o médico, que é professor da Universidade Federal de São Paulo e especialista em queloides.

1 - Responsáveis pelo colágeno
Os fi broblastos são células presentes na segunda camada da pele, a derme, e são responsáveis pela produção de colágeno e da substância que envolve estas fibras — a matriz extracelular, fundamental para a qualidade e a regeneração desse tecido.

Veja abaixo a versão impressa da matéria (clique na imagem para ampliar):

 

 


Fonte: Correio Braziliense

POSTADO EM 14/05/2010

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